sábado, novembro 30

Dupla Identidade - Parte 3: Perda

Alta, elegante, vistosa e feliz, Bárbara tinha tudo o que uma mulher queria ter, era tudo o que uma mulher desejava ser, a sua profissão de modelo e estilista completavam o role de charme e estilo. Vivia o romance de sonho, e estava noiva à pouco mais de três meses. O seu futuro marido, Alfredo, era polícia e investigava uma rede de tráfico de diamantes, estava infiltrado e completamente obcecado pelo trabalho, nada parecia ter mudado na imaginação de Bárbara, mas para ele o mundo estava completamente invertido, começava a questionar o seu relacionamento. 
Num dia de manhã em que Alfredo entrava cedo, foi surpreendido pela noiva enquanto estava no duche: - Bom dia! – Exclamou a voz suave e doce de Bárbara. – Bom dia. – Respondeu de forma áspera o noivo ainda sonolento. Enquanto, Alfredo tomava banho completamente afastado do local onde estava, Bárbara ignorava a ausência dele, o seu sorriso radiante de mulher apaixonada, deu início a uma frase que viria a ser preocupante: - Fred, tenho uma excelente notícia que vai alterar os nossos planos de casamento… - O homem despertou do transe e perguntou: - O que é? – Bárbara voltou a sorrir de forma profunda e feliz, respondendo: - Porque estou grávida! – Alfredo parou, desligou a torneira e fitou a mulher que estava perto dele: - Grávida? – Sim! – Respondeu a loira entusiasmada. Aquele momento que deveria ser único e especial, tornou-se no pior pesadelo que o polícia poderia ter imaginado. Não conseguindo disfarçar a desilusão saiu da banheira, colocou uma toalha à cintura e caminhou para fora da casa de banho, Bárbara seguiu-o já mais preocupada com a reacção: - Não é maravilhoso? Vamos ser pais! – Alfredo não respondeu, limitou-se a beijar a testa da noiva, dizendo: - Sim, estamos de parabéns.
Depois de mais um dia de trabalho Bárbara regressou a casa, com a melhor amiga, Eva, radiante por tudo aquilo que lhe estava a acontecer. Assim que colocou a chave a porta viu a luz da cozinha acesa, Alfredo estava absolutamente dedicado a preparar-lhe o jantar. As duas mulheres estavam genuinamente surpreendidas, afinal não era todos os dias que tinham um homem a cozinhar para elas. Sentaram-se e jantaram os três de forma calma e harmoniosa, eram uma autêntica família os três juntos. De repente, Bárbara começou a sentir umas cólicas estranhas, contorceu-se na cadeira, Eva e Alfredo levantaram-se imediatamente da mesa, assim que Bárbara caiu no chão, viu Eva e Alfredo a trocarem passaportes e a trocarem beijos e caricias. – O que se passa Alfredo? – Eva sorriu, com aquela expressão fria e distante, e respondeu pelo futuro noivo: - Agora podes tratá-lo por Marcos. – Abandonaram a sala e deixaram-na ali, deitada no chão cheia de dores, em completa agonia e prestes a perder o maior sonho da sua vida.

quinta-feira, novembro 28

Dupla identidade - Parte 2: Tortura

Ver a arma apontada à cabeça de Eva, fazia Marcos sentir-se impotente: - Por favor não lhe faças mal! – As lágrimas do homem começavam a inundar-lhe a face, e a loira fitava-o com ódio: - Diz onde é que estão! – A arma aproximou-se mais da testa de Eva, até que se ouviu um grito que dizia: - No sótão nº3 do prédio onde nós vivíamos! – Eva olhou para os olhos azuis de Marcos, ele estava aterrorizado, ela própria não se sentia tão assustada quanto ele. A loira travou o revólver e fez sinal aos homens que agarravam Marcos, eles acenaram de volta e começaram a espancá-lo. Eva sentiu-se em dívida para com ele, para além disso estava chocada por saber que outrora partilhava uma vida com o homem que estava a ser espancado, numa tentativa de travar aquela a atrocidade, disse num tom de raiva: - Parem! Ele já vos deu o que queriam! Deixem-no! – A loira olhou para trás, o seu olhar emanava ódio e raiva, continuou a caminhar elegante para a porta, os homens seguiram-na e a cadeira de Marcos partiu-se. Assim que a porta de ferro fechou Eva rastejou para junto de dele e perguntou: - Consegues ouvir-me? – Era quase impossível distinguir as feições dele, apenas se destacavam os seus hipnotizantes olhos azuis, que pestanejaram mal a viram. Ele tentava responder, mas faltava-lhe a força, era totalmente impossível saírem dali.
Passaram largos minutos fechados naquele sítio, Eva queria ouvir respostas, mas Marcos não tinha condições para as dar, enquanto ela tentava ingloriamente retirar as cordas que amarravam as suas mãos e pés, ele recuperava a pouca vida que lhe restava. A corda estava prestes a ceder até que Eva ouviu um sussurro baixinho: - Eva… - Virou-se repentinamente para encarar o moribundo e respondeu: - Sim… Sou eu… Como te sentes? – Marcos sorriu e respondeu: - Muito melhor… – Eva sentiu que aquela frase era um cliché incomodativo, principalmente porque não se lembrava dele, por isso perguntou: - Quem é aquela mulher? O que é que ela quer? – Os olhos de Marcos escureceram, ele pensou por segundos que ela lhe ia perguntar como tinham sido os tempos de casamento, a ilusão era tudo o que lhe restava. Depois da desilusão instalou-se o medo; como é que ele lhe iria contar a verdade?
Bárbara saiu do seu Lexus preto e caminhou pelo passeio com os seus quatro guarda-costas, finalmente tinha conseguido a vingança que queria, roubar tudo o que podia à antiga amiga, tal como ela lhe tinha roubado o amor da sua vida. A perda de memória que lhe tinha causado foi apenas um bónus, o grande golpe estava prestes a acontecer, no momento em que abrisse a porta daquele sótão.

quarta-feira, novembro 27

Dupla Identidade - Parte 1: Esquecimento

Eva olhou para o espelho e ficou hipnotizada com a escuridão dos seus olhos, não sabia o que pensar, quem era aquele homem que a cumprimentava e observava todos os dias no café? A sua memória estava longe de querer regressar, ela estava perdida no esquecimento, sem esperança de recuperar o passado. Desde a sua queda e da consequente amnésia que se sentava na mesa do canto, e ele sentado no balcão, observa-a todos os dias à mesma hora. Era assustador, arrepiante, ele parecia conhece-la, ela ignorava o nome dele. Saiu da frente do espelho e vestiu o casaco de caxemira comprido, com umas moedas no bolso, a camisa de dormir por baixo, as botas altas, o cachecol e o cabelo apanhado era tudo o que precisava para se afogar num café expresso sem açúcar. A doce e suave ignorância da vergonha do seu passado confundia-se com a amarga solidão que sentia, caminhou em passos largos e pesados até chegar ao cruzamento, assim que dobrou a esquina, para percorrer um atalho até às traseiras do café, foi puxada por um alguém encapuçado e vestido de negro que lhe tapou a boca. Ela só conseguia pensar em dar-lhe tudo o que ele quisesse para que não lhe fizesse mal, mas antes de conseguir reagir ele sussurrou-lhe ao ouvido: - Nem penses em gritar Eva, sabes do que sou capaz. Onde é que estão? – Com isto destapou-lhe os lábios e Eva respondeu assustada: - O quê? – O homem voltou a tapar-lhe a boca e assobiou. Após o agudo som apareceram mais três homens e uma mulher que a pontapearam fervorosamente, até que uma voz feminina lhe puxou o cabelo e disse: - Vamos levá-la até que nos digam onde estão. – Segundos depois de mais uma forte pancada na cabeça Eva deixou-se ir, a escuridão voltou a envolve-la.

Abriu os olhos e começou a sentir o corpo dorido, amassado de tantos pontapés, as mãos e os pés atados e o seu cabelo desgrenhado anunciavam uma breve tortura. Com alguma dificuldade conseguiu virar-se para a porta e, subitamente, lá estava ele de novo, o homem que a observava todos os dias no café. Sentado numa cadeira, amarrado, ensanguentado e amordaçado. Eva tinha a garganta seca, o frio gelava-lhe o nariz e as mãos, a sua voz rouca e desesperada perguntou em modo de sussurro: - Ei! Tu aí! – O homem moribundo levantou o olhar e pousou-o nela. – Consegues chegar a cadeira para aqui? Eu solto os teus pés, e depois tento as mãos. – O homem de olhos azuis pareceu desesperado, pareceu reconhece-la novamente e surpreendido por vê-la ali. Rapidamente começou a puxar a cadeira para junto dela, o som que ecoava entre aquelas paredes dificilmente passaria despercebido. Enquanto ele lutava para chegar junto dela, e ela dele, ouviram-se passos nos corredores do outro lado da porta, a fechadura rodou vagarosamente e do outro lado estava novamente a mulher e os quatro homens. Eva e o homem de olhos azuis olharam para eles aterrorizados e depois um para o outro, foi nesse momento que Eva reparou no olhar de preocupação que assombrava o moribundo. – As botas pontiagudas, altas e de salto agulha da mulher loira caminharam em direcção a ela, os quatro homens agarraram o moribundo e destaparam-lhe a boca, pelo que ele gritou: - Não lhe faças mal! A culpa não é dela! Ela já não sabe de nada! – A mulher parou, rodou a cabeça para trás, retirou um revolver do bolso do casaco, sorriu e respondeu: - Diz-me onde é que estão Marcos, ou a tua mulher vai conhecer o conteúdo da minha arma. – Apavorado, Marcos olhava para aquela que outrora tinha sido a sua esposa, o sacrifício de desaparecer da memória e da vida daquela que amava, não tinha sido o suficiente. Já não era só a culpa que o corrompia, agora também o medo parecia querer apoderar-se dele.

Pequenas Histórias Originais - Catarina R.P.

quarta-feira, novembro 20

Disconnect - Desligados

Unidos online, mas separados na realidade.

Henry Alex Rubin é um realizador pouco conhecido, com um tímido trabalho que consegue chegar aos mais ínfimos problemas da sociedade. Este filme demonstra como o mundo virtual tomou o lugar das longas conversas à lareira, os sons dos chats roubaram as palavras sinceras e o contacto emocional verdadeiro e prolongado foi substituído por relações efémeras e precoces.
A construção emocional de todos nós é feita de longas e construtivas conversas, de partilha de histórias e momentos, de caricias mais ou menos convencionais e discussões pessoais ridículas ou não. Alguém que passa o tempo a partilhar estados irrelevantes, alguém que se afoga em imagens em vez de se rodear de pessoas e que movimenta vídeos de forma a revelar o que sente não pode ter o mesmo amadurecimento emocional que alguém que encara gente, que as conhece e que se relaciona mal ou bem com cada uma delas. É interessante como tudo no inicio começa com toda a gente a comunicar virtualmente e no fim todos têm necessidade de se encontrarem pessoalmente e se conhecerem, a realidade é que nem tudo o que achamos que conhecemos é a verdade, e isso gera insegurança, incerteza e violência.
Um argumento envolvente com uma realização e fotografia ainda um pouco insensatas. Interpretações que oscilam entre o bom e o excelente e uma banda-sonora que prima pela simplicidade.
Disconnect é a hipócrita metáfora de uma sociedade esfomeada de compreensão, compaixão e amor. Um filme que despe os sentimentos que inundam o nosso quotidiano como; o medo, a vergonha e sobretudo e principalmente a solidão. Porque comunicar não é estabelecer laços, ainda que ambos queiram tocar-se.

quarta-feira, novembro 6

Ripper Street

The Original British Drama que começou há um ano e eu só me apercebi da sua magnificência agora...

Ripper Street é a típica série inglesa que tem um tema cliché, mas foge ao convencional. Comecei a ver há pouquíssimo tempo e já consegui actualizar-me até ao novo episódio que saiu esta semana. Para além de ter como tema central o Jack The Ripper tem outros casos interessantíssimo de seguir e desvendar, é no fundo uma espécie de Sherlock Holmes com um argumento mais inteligente e profundo e com actores principais e secundários que são fabulosos, falo obviamente de Matthew Macfadyen, Jerome Flynn e Adam Rothenberg. Conheço trabalhos anteriores de todos eles e tenho a dizer que Rothenberg me surpreendeu bastante pela positiva, absolutamente irreconhecível nesta personagem. Quanto a Flynn e Macfadyen fico-me pelo meu primeiro comentário: "Isto só vem confirmar que eles são brilhantes!", especialmente o segundo pelo qual tenho um especial carinho cinematográfico.
Cada vez mais abandono as séries Americanas para começar a deliciar-me com as Inglesas, desde mini-séries da BBC até as mais badaladas, não consigo deixar de pensar que cada vez mais a televisão inglesa supera (pelo menos em qualidade argumentativa) a americana.
A primeira temporada começou bem e acabou ainda melhor, a segunda está a caminhar a passos largos para ser uma magnifica e agradável surpresa.
Brevemente estarei de novo a comentar.